terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Só é copiado porque é bom...

ALCINO LEITE NETO EDITOR DE MODA
As grandes marcas não deveriam se inquietar tanto assim com as cópias de seus produtos. Para o pesquisador italiano Andrea Semprini, é justamente porque as grifes têm prestígio que elas são copiadas. Não fossem certas marcas estimadas pelo consumidor, ninguém se interessaria em imitá-las, defende Semprini, que é professor da universidade Paris 4-Sorbonne, da Universidade Iulm (Milão) e dirige o instituto Arkema, onde presta assessoria a grandes marcas. Nesta semana, ele faz em São Paulo uma palestra no Simpósio Internacional Fiat 30+ (leia nesta página) e lança no país o seu livro "A Marca Pós-Moderna: Poder e Fragilidade da Marca na Sociedade Contemporânea" (ed. Estação das Letras). De Paris, onde mora, Semprini respondeu por e-mail à entrevista a seguir.

FOLHA - Como o sr. descreveria a relação do consumidor atual com as marcas? ANDREA SEMPRINI - O consumidor contemporâneo é mais crítico, mas também mais oportunista e menos fiel em relação às marcas. Não se pode esquecer que, graças à internet e às mídias, esse consumidor é hoje mais bem informado e pode comparar preços, performance dos produtos e qualidade dos serviços. Mas o consumidor atual também procura nas marcas uma transparência, uma honestidade e uma sinceridade novas. E uma consideração a respeito de sua sensibilidade, da orientação de seus gostos, e não apenas de suas necessidades. Basta pensar no sucesso crescente, na Europa, dos produtos "fair trade" [comércio justo] para ver como o consumidor procura um acréscimo de sentido ao seu consumo e pede às marcas que tenham projetos que se insiram entre as grandes questões de nossa época.
FOLHA - Por que as marcas adulam tanto os jovens? SEMPRINI - O papel deles é extremamente importante. Em primeiro lugar, porque freqüentemente descobrimos uma marca na juventude e acabamos ligados a ela durante toda a vida desse produto. Em segundo lugar, porque os jovens são muito sensíveis à extensão social, comunitária dessas marcas. Para eles, a idéia de pertencimento a um grupo é fundamental, e as marcas podem criar essa sensação. Basta pensar no sucesso mundial do iPod, verdadeiro objeto de culto para os jovens. Em terceiro lugar, os jovens são grandes consumidores de novidades tecnológicas. E as marcas que não se encontram onde os jovens estão correm o risco de não serem detectadas pelo radar deles e, portanto, de não lhes interessar. Mas os jovens são também portadores de novos valores. Mesmo se uma parte deles adere ao discurso das marcas, uma outra parte desenvolve um certo distanciamento crítico com relação a elas, porque se ressente do estímulo permanente do mercado. As marcas nunca foram tão fortes, ricas e influentes como hoje, mas, se elas são também frágeis, é em parte por causa desta desconfiança crítica que se desenvolve nos jovens.
FOLHA - O que a cópia e a pirataria incontroláveis podem nos dizer sobre o futuro das marcas? SEMPRINI - As marcas de luxo se inquietam muito com esses tipos de crime. Eu posso compreendê-los, mas, ao mesmo tempo, constato que as marcas mais copiadas são também aquelas que se comportam melhor do ponto de vista comercial e financeiro. Parece-me, portanto, que a contravenção é de algum modo um indicador de prestígio de uma marca. A cópia só se desenvolve se a marca é fortemente desejada pelos consumidores. Se esse ponto de vista for justo, uma marca deveria se inquietar muito mais, caso ninguém tivesse interesse em copiá-la.
FOLHA - O que o sr. pensa do crescimento das marcas "fast fashion", como Zara? SEMPRINI - Penso que o fenômeno Zara é provavelmente a coisa mais interessante que se produziu no universo da moda depois de décadas. Porque isso não representa apenas uma revolução tecnológica e comercial, mas uma adaptação às novas condições de consumo da moda e um exemplo perfeito daquilo que meu livro chama de marca pós-moderna. A Zara compreendeu (e soube transformar essa intuição em realidade industrial) que a moda vai cada vez mais se liberar dos ciclos sazonais (as coleções) e dos imperativos de alguns estilistas em voga. A política de preços da Zara e a rapidez fulgurante da rotação do estoque dessa marca permitem a uma mulher comprar uma roupa apenas para uma ocasião particular, quase que numa lógica de consumo "para uma única vez". Ao mesmo tempo, não considero que o sucesso da Zara e de outras marcas "fast fashion" possam representar uma ameaça às grifes de luxo. Vejo muito mais uma complementaridade, porque, de agora em diante, é permitido misturar uma blusa Zara com uma calça Prada. As marcas que sofrerão mais com esse novo fenômeno são aquelas do "prêt-à-porter" de porte médio, como Gap e Banana Republic, que não têm o prestígio das marcas de luxo, nem o frescor e o preço da "fast fashion".
FOLHA - Que momento da história do mercado e da mercadoria estamos vivendo: o da aceleração de um consumo hipermassificado ou o da proliferação de diferentes modos de consumo numa sociedade cada vez mais diversificada? SEMPRINI - Sua questão é importante e está no centro de toda a primeira parte do meu livro. As novas tecnologias e os desenvolvimentos socioculturais levam rumo ao individualismo e à personalização dos gostos. Desse ponto de vista, nós iremos rumo a uma fragmentação das formas de consumo, segundo lógicas tribais e comunitárias.É típico dos mercados pós-modernos rejeitar as grandes lógicas coletivas que animaram a sociedade de consumo de massa. Penso, portanto, que o período das grandes marcas fordistas, fortemente estandardizadas (General Motors, McDonald's, Coca-Cola), conheceu seu apogeu e está em declínio.Por outro lado, novas formas de conformismo podem aparecer, veiculadas notadamente pelo sistema midiático (as novas estrelas do espetáculo e do jet set). É, paradoxalmente, uma particularidade da condição pós-moderna empurrar para a pesquisa de novas narrações fortes em torno das quais as pessoas possam se reencontrar e se reunir.O consumo de amanhã será então caracterizado por uma mistura muito pessoal de escolhas totalmente individuais (seleção de informação pela internet, mistura de estilos de moda e de vida) e formas de adesão coletiva que serão ao mesmo tempo limitadas no tempo e sobretudo praticadas com muito mais distância e ironia do que no passado.Frases"O consumidor contemporâneo é mais crítico, mas também mais oportunista e menos fiel em relação às marcas"
"As marcas mais copiadas são também aquelas que se comportam melhor do ponto de vista comercial e financeiro. Parece-me, portanto, que a contravenção é de algum modo um indicador de prestígio"
ANDREA SEMPRINI pesquisador italianosaiba maisEvento debate o consumo e a cultura
DA REDAÇÃOO simpósio internacional Fiat 30+ vai reunir pesquisadores de diferentes áreas para discutir tendências mercadológicas, culturais e tecnológicas. O evento acontece na terça e na quarta, no Tuca (Teatro da Universidade Católica -PUC-SP), na r. Monte Alegre, 1.027. As inscrições, no site http://www.simposiofiat30mais.com.br/, são gratuitas.

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